Neste artigo pretendo estudar as condições sob as quais podemos obter o revestimento de poder. Tomemos informações nas Escrituras. Não pretendo encher este jornal de citações da Bíblia, mas simplesmente registrar alguns fatos que serão logo reconhecidos por todos os leitores das Escrituras. Se os leitores do presente artigo quiserem conhecer, no último capítulo de Mateus e de Lucas, a incumbência que Cristo deu aos discípulos, e, ainda, os dois primeiros capítulos de Atos dos Apóstolos, estarão prontos para apreciar o que vou dizer neste artigo.
1) Os discípulos já estavam convertidos a Cristo, e tiveram confirmada a sua fé pela ressurreição de Jesus. Nesta altura, porém, devo esclarecer que a conversão a Cristo não deve ser confundida com a consagração à grande obra da conversão do mundo. Na conversão, a pessoa trata direta e pessoalmente com Cristo. Abre mão dos seus preconceitos, antagonismos, justiça própria, incredulidade e egoísmo. Aceita Cristo, confia nele e a ele ama acima de tudo. Tudo isso os discípulos tinham feito, uns mais claramente. Outros, menos. Ainda não tinham recebido, porém, nenhuma incumbência precisa, nem tampouco qualquer revestimento especial de poder para desempenharem uma incumbência.
2) Depois, porém, que Cristo dissipou o desnorteamento que lhes resultara da crucificação de Jesus e confirmou sua fé por meio de repetidos encontros com eles. Deu-lhes a grande incumbência de ganhar para ele todas as nações. Admoestou-os, porém, a que aguardassem em Jerusalém até que fossem revestidos de poder do alto, o que, disse ele, haviam de receber dentro de poucos dias. Observemos agora o que fizeram. Reuniram-se, homens e mulheres, para orar. Aceitaram a incumbência, chegando, sem dúvida, à compreensão da natureza do encargo e da necessidade do revestimento espiritual que Cristo lhes prometera. Ao continuarem, dia após dia, em oração e conferência, chegaram, sem dúvida, a apreciar cada vez mais as dificuldades que os haviam de cercar, e a sentir cada vez mais a sua própria insuficiência para a tarefa.
Se examinarmos as circunstâncias e os seus resultados. Chegaremos à conclusão de que eles, sem exceção, se consagraram e tudo quanto tinham para a conversão do mundo, como sendo esta a tarefa da vida. Abandonaram totalmente a idéia de viverem para si mesmos, e se dedicaram com todas as forças à obra que lhes fora confiada. Essa consagração de si mesmos à obra, essa auto-renúncia, esse morrer para tudo quanto o mundo lhes pudesse oferecer, forçosamente precedeu a busca inteligente do prometido revestimento de poder do alto. Continuaram então, de comum acordo, em oração pelo prometido batismo do Espírito, que abrangia tudo quanto era essencial ao bom êxito.
Nota. Eles tinham diante de si uma obra a realizar. Tinham uma promessa de poder para que a pudessem desempenhar. Foram admoestados a esperar até que a promessa se cumprisse. Como esperaram? Não na indiferença e inatividade; não em preparativos, por meio de estudos e outros recursos, visando dispensar o poder prometido; não se entregando aos afazeres normais e fazendo de vez em quando uma oração pedindo que cumprisse a promessa; ao contrário, permaneceram em oração e persistiram no pedido até que veio a resposta. Compreendiam que seria um batismo do Espírito Santo. Sabiam que viria da parte de Cristo. Oraram com fé. Aguardaram na mais firme expectativa, até o revestimento. Deixemos, pois, que esses fatos nos instruam quanto às condições para se receber o revestimento de poder.
Nós, como cristãos, temos a mesma incumbência. Tanto quanto aqueles discípulos, necessitamos do revestimento de poder do alto. Evidentemente a mesma ordem nos é dada, de esperarmos em Deus até que o recebamos. Temos a mesma promessa que eles tinham: tomemos, pois, essencialmente e em espírito, o mesmo caminho que tomaram. Eles eram crentes e tinham certa medida do Espírito para guiá-los na oração e na consagração. Nós também o temos.
Todo crente possui certa medida do Espírito de Cristo, o suficiente do Santo Espírito para nos levar à verdadeira consagração e nos inspirar com a fé que é essencial para a vitória na oração. Deixemos, pois, de entristecê-Io ou resistir-lhe: aceitemos a incumbência, consagrando-nos integralmente, com tudo quanto possuímos, à salvação de almas, como o nosso grande e único trabalho na vida. Coloquemos-nos sobre o altar, como tudo que temos e somos, ali permanecendo e persistindo na oração até que recebamos o revestimento.
Quero reafirmar que a conversão a Cristo não deve ser confundida com a aceitação dessa incumbência de salvar o mundo. Aquela é uma transação pessoal entre a alma e Cristo, tratando da própria salvação; esta é a aceitação do serviço em que Cristo se propõe a ocupar-nos. E Cristo não nos exige a confecção de tijolos sem nos fornecer a palha necessária. Àquele a quem ele dá a incumbência, dá também a admoestação e a promessa. Se de coração aceitarmos o serviço, crermos na promessa e atendermos à admoestação a que esperemos no Senhor até que a nossa força seja renovada, havemos de receber o revestimento.
É da mais absoluta importância que compreendamos que cada crente individualmente recebe de Cristo o encargo de conquistar o mundo. Todos nós temos sobre os ombros a grande responsabilidade de ganhar para Cristo o maior número possível de almas. É esse o grande privilégio e dever de todos os discípulos de Cristo. Há vários setores nesse trabalho, mas para todos eles podemos e devemos possuir poder, para que, quer preguemos ou oremos, escrevamos ou publiquemos, negociemos, viajemos, cuidemos de crianças ou administremos o governo do Estado, seja qual for a nossa ocupação, toda a nossa vida e influência sejam repletas desse poder. Cristo declara: “Quem crer em mim, como diz a Escritura, do seu interior fluirão rios de água viva”; quer dizer, que dele procederá a uma influência cristã, tendo em si o fator do poder para levar a impressão da verdade de Cristo ao coração dos homens.
A grande carência da Igreja atualmente é, primeiro, a convicção profunda de que essa incumbência de ganhar o mundo é dada a cada um dos discípulos de Cristo como a tarefa a realizar na vida. É lamentável termos de dizer que a grande massa dos cristãos professos, segundo parece, nunca se impressionou com essa verdade. O trabalho de salvar almas deixam-no por conta dos ministros.
A segunda grande carência é a convicção profunda da necessidade desse revestimento de poder sobre cada um individualmente. Muitos que professam a fé imaginam que isso é apenas para aqueles que são chamados para a carreira ministerial. Deixam de compreender que todos são chamados a pregar o evangelho; que a vida inteira de cada cristão deve ser uma proclamação das boas-novas.
Falta, em terceiro lugar. Uma fé sincera na promessa desse revestimento. Vasto número de crentes professos, e até mesmos pastores, parece duvidar que a promessa seja realmente para toda a Igreja. Se não pertence a todos, eles não sabem a quem pertence. Evidentemente não podem reclamar a promessa pela fé.
Em quarto lugar, falta aquela perseverança em esperar em Deus, que as Escrituras recomendam. Desfalecem antes de obter a vitória, e, por conseguinte. Deixam de receber o revestimento. Multidões, ao que parece, satisfazem-se com a esperança da vida eterna. Nunca deixam para trás a questão da própria salvação, entregue a Cristo como assunto liquidado. Não aceitam a grande incumbência de trabalhar para a salvação de outros, porque a sua fé é tão fraca que não abandonam confiantemente nas mãos de Cristo a questão da própria salvação. Até mesmo ministros do evangelho, segundo tenho observado, estão no mesmo caso e coxeando do mesmo modo, incapazes de se entregarem completamente ao trabalho de salvar outros, porque, até certo ponto, estão inseguros quanto à própria salvação.
É simplesmente espantoso a que ponto a lgreja tem praticamente perdido de vista a necessidade desse revestimento de poder. Quase todos afirmam que somos dependentes do Espírito Santo, porém essa dependência é muito pouco apreciada. Crentes e até mesmo pastores póem-se a trabalhar sem ele. Lastimo ser obrigado a dizer que as fileiras do ministério, ao que parece, estão-se enchendo de homens que o não possuem. Oxalá o Senhor tenha misericórdia de nós! Será julgada descaridosa essa última afirmativa? Se for, ouçamos, por exemplo, o relatório da Sociedade de Missões Internas, sobre o assunto. Não se há de negar que alguma cousa está mal.
A média de cinco almas ganhas para Cristo por missionário daquela sociedade em um ano de trabalho, indica inegavelmente uma fraqueza alarmante no ministério. Será que todos, ou mesmo a maioria, desse ministros foram revestidos do poder que Cristo prometeu? Se não o foram, qual a razão? Se o foram, foi só isso que Cristo pretendeu pela sua promessa?
Em artigo anterior afirmei que o recebimento desse poder é um fato instantâneo. Não quero com isso dizer que, em todos os casos, a pessoa que o recebeu ficou ciente da hora exata em que o poder começou a operar poderosamente em seu ser. Pode ter começado como o orvalho e aumentado até tornar-se uma chuva.
Fiz referência ao relatório da Sociedade de Missões Internas, não que eu imagine que os irmãos que trabalham naquela sociedade sejam excepcionalmente fracos em fé e poder como obreiros de Deus. Pelo contrário, baseado no meu conhecimento pessoal de alguns deles, considero-os entre os mais consagrados e abnegados obreiros da causa de Deus. Esse fato ilustra a assustadora fraqueza que existe em todos os ramos da Igreja, tanto o clero como os leigos. Então não somos fracos? — criminosamente fracos?
Talvez alguém pense que, escrevendo desta maneira, ofenderei o ministério e a Igreja. Não posso crer que o registro de fato tão palpável seja considerado ofensa. A verdade é que alguma cousa está lamentavelmente deficiente na educação do ministério e da Igreja. O ministério está fraco, porque a Igreja está fraca. E a Igreja conserva-se fraca pela fraqueza do ministério. Oxalá houvesse a convicção da necessidade desse revestimento de poder e da fé na promessa de Cristo!