Salmo 51:17
Nenhum outro salmo expressa tão plenamente a experiência pela qual passa a alma que tem sido guiada ao arrependimento: sua humilde confissão de pecado (v. 3,4,5); seu desejo intenso de ser perdoado pelos méritos do sangue de Cristo (v. 7); sua ansiedade para que o Senhor lhe conceda um coração puro (v.10); sua vontade de oferecer algo a Deus por todos seus benefícios.
Diz o salmista que ele ensinará aos prevaricadores o caminho de Deus; diz que seus lábios, pela graça de Deus, se abrirão para proclamar os louvores a Deus; manifesta que oferecerá a Deus um espírito quebrantado e humilhado (vs. 16,17). Vem assim dizer que, do mesmo modo que tem oferecido (seguindo os ritos mosaicos) numerosos cordeiros imolados em ações de graça a Deus, também agora oferecerá a Ele, como um cordeiro imolado, seu coração quebrantado. Cada um que tem pedido o mesmo perdão de Deus e que chegou, no passado, à mesma resolução de oferecer a Deus um coração quebrantado, poderá receber de graça esta bênção hoje.
1. O coração natural é um coração não ferido, não quebrantado.
A lei de Deus, suas misericórdias, as aflições que acontecem não quebrantam o coração natural. Ouve falar da Lei de Deus, de Suas misericórdias e continua impassível. É mais duro que uma pedra. Nada há no universo tão duro. “Ouvi-me, vós que sois de coração obstinado (duro), que estais longe da justiça” (Is. 46:12). “Nós já percorremos a terra, e eis que toda a terra está agora repousada e tranqüila” (Zc. 1:11).
“Naquele dia esquadrinharei a Jerusalém com lanternas, e castigarei os homens que estão apegados à borra do vinho (“assentados sobre as suas fezes” – outra versão), e dizem no seu coração: O Senhor não faz bem nem faz mal”. (Sofonias 1:12). “… endureceram os seus rostos mais do que a rocha; não quiseram voltar’ (Jr. 5:3). “Levantai-vos, mulheres que viveis despreocupadamente, e ouvi a minha voz; vós, filhas, que estais confiantes…” (Is. 32:9-11).
Por quê? Por que é tão duro o coração natural?
Primeiro: Porque há um véu sobre ele. Porque o coração do homem natural se acha coberto por um espesso véu. Não crê na Bíblia, nem nos escritos da Lei, nem na ira que há de vir; um trágico véu cobre seus olhos.
Segundo: Porque Satanás é dono do coração natural. Satanás leva-lhe a semente perniciosa tão prontamente como possa.
Terceiro: Porque o homem natural está morto em seus delitos e pecados. Os mortos não ouvem, não sentem; carecem de sentimentos e sensibilidade espiritual.
Quarto: Porque se tem construído uma barreira de despreocupação que lhe será mortal. O coração natural confia mais em qualquer refúgio falso, refúgio de mentira, como diz a Bíblia. Confia em rezas ou em esmolas.
Peça a Deus que o livre da maldição de um coração morto, não quebrantado, não contrito e humilhado.
Primeiro, porque não passará muito tempo tranqüilo em sua falsa confiança; você se achará sobre lugares escorregadios e as ondas do oceano rugindo sob seus pés.
Segundo, porque Deus lhe demonstrará a eternidade com todo o seu infortúnio. Se você se voltar agora, há esperança certa de perdão. Cristo está pronto a perdoar. Mas depois, na eternidade, Seu juízo cairá sobre você.
2. O coração despertado é um coração ferido, porém não quebrantado, não roto.
a. A lei inflige a primeira ferida. Quando Deus se dispõe a salvar uma alma a leva primeiramente a preocupar-se com seus pecados.
“Maldito todo aquele que não permanece em todas as coisas que estão escritas neste livro da lei, para praticá-las” (Gl. 3: 10). “Outrora, sem lei, eu vivia; mas sobrevindo o preceito, reviveu o pecado, e eu morri” (Rm. 6:21). A vida e o coração de cada um adquirem então tremendas cores.
b. A majestade de Deus produz a segunda ferida. O pecador recebe a sensibilidade que lhe faz sentir a grandeza e a santidade dAquele contra quem tem pecado. “Pequei contra ti, contra ti somente” (v.4).
c. A terceira ferida procede de sua própria incapacidade para melhorar a si mesmo . Neste estado, todavia, o coração não tem sido quebrantado; o coração se levanta contra Deus.
Primeiro, pelo rigor da Lei: “Se não fosse tão exigente… !”.
Segundo, porque a fé é o único caminho da salvação e ela é um dom de Deus: “Queria merecer a salvação e ganhá-la”.
Terceiro, porque Deus é soberano e pode, ou não, salvar segundo a Sua vontade. Isto é o que há num coração não quebrantado. Não existe outro estado e situação mais miserável.
Aprendamos que uma coisa é ser despertado, e outra muito diferente é ser salvo.
3. O coração do crente é um coração quebrantado em dois aspectos.
Tem sido quebrantado de sua própria justiça e de sua própria possibilidade de justificar-se. Quando o Espírito Santo leva uma alma à cruz, esta se desespera de justificar-se pelos seus próprios méritos e justiça. Todo o seu fardo, todas as suas próprias justiças e suas próprias opiniões se derramam como um líquido que se perde ao romper-se o frasco que o contém.
Primeiro, porque a obra de Cristo se mostra tão perfeita tanto quanto a sabedoria e o poder de Deus. O pecador vê na obra da cruz a justiça de Deus. “Maravilho-me ao pensar que houve um tempo em que busquei outros caminhos de salvação. Pensando podê-los obter com minhas obras, certamente que com todas as minhas forças me lancei a eles. Maravilho-me ao pensar que o mundo não tem compreendido, nem tem aceitado que o único caminho da salvação é a justiça de Cristo” (David Brainerd).
Segundo. A graça de Cristo tem tanto esplendor! Quão maravilhoso é, que toda a justiça de Cristo, tão excelsa e divina, seja oferecida gratuitamente ao pecador! Maravilhoso é que eu, que fui deliberadamente negligente, que menosprezei a Cristo, que odiei Sua obra, que coloquei obstáculos ao Seu chamado levantando entre Ele e mim verdadeiras montanhas, tenha sido objeto de Seu amor e, apesar de tudo, tenha Ele vindo a mim, passando sobre todas elas! “… para que te lembres, e te envergonhes, e nunca mais fale a tua boca soberbamente, por causa do teu opróbrio, quando eu te houver perdoado tudo quanto fizeste, diz o Senhor Deus” (Ez. 16:63). Você tem este coração quebrantado e contrito diante da visão da cruz de Cristo? Não será uma olhada ao seu próprio coração, ou ao coração do inferno, mas ao coração de Cristo, o que realmente quebrantará seu coração. Peça que Deus lhe dê um coração quebrantado assim! O orgulho e a jactância estão excluídos. A Ele seja a glória; digno é o Cordeiro! Todas as batalhas e os esforços da alma que busca sua própria justificação têm de ser tirados e desprezados.
O coração quebrantado tem visto desfeito seu amor para com o pecado – Quando um homem crê em Cristo, percebe que agora o pecado o aborrece. Primeiro, porque o separa de Deus, abrindo entre ele e Deus um grande abismo que arrasta o homem à condenação do inferno.
Segundo, porque o pecado levou Cristo, o Senhor da glória, à cruz; foi um “grande fardo” que pesou sobre Sua alma, que O fez suar, sangrar e morrer.
Terceiro, porque é o sofrimento do coração de Cristo agora. Toda a minha infelicidade se deve ao fato de ser um pecador. Agora o crente se lamenta e chora por haver pecado contra quem tanto o ama: “Então recordarás teus caminhos e todas as coisas nas quais tens vivido impiamente e te aborrecerás de ti mesmo”.
4. As vantagens de um coração quebrantado.
1. Guardar-se-á de te ofender-se por causa da pregação da cruz. O coração natural se ofende quando se lhe prega a cruz. Muitos a odeiam e a desprezam. Muitos, sem dúvida, se enfurecem freqüentemente no mais íntimo de seus corações ao ouvirem a pregação sobre aceitar a justiça de Cristo e deixar a sua própria justiça, se não quiser perecer.
Muitos têm deixado a Igreja por causa desta pregação, não querendo seguir esse caminho. O escândalo e a ofensa da cruz não terminaram.
Em troca, o coração quebrantado não pode ofender-se de tal pregação.
Os pastores podem falar de forma simples e direta a verdade aos corações quebrantados. Um coração quebrantado sente-se alegre em ouvir acerca da justiça (justificação) sem obras.
Muitos se ofendem quando falamos claramente sobre o pecado; muitos se ofendem nos domingos ao ouvir a mensagem. Porém, o coração quebrantado e contrito não se ofende, porque odeia o pecado mais que os pastores, às vezes, podem fazê-lo. Há muitos como os adoradores de Baal: “Leva para fora o teu filho, para que morra (Jz. 6:30). Do mesmo modo, quem não tem um coração quebrantado respira ameaças contra o pecador que destrói o ídolo do seu orgulho; porém um coração quebrantado deseja ver o ídolo destronado, derrotado e convertido em fragmentos.
2. O coração quebrantado descansa ao final. O coração natural é como o mar tempestuoso. “Quem nos mostrará o bem?”. E corre perguntando de pessoa em pessoa, procurando para seu próprio prazer, “o bem”. Um coração apenas despertado não tem paz. Os temores da morte e do inferno ameaçam – assim descobrem desesperados sua alma desde que foram tirados bruscamente de sua condição de sono, de estado de repouso e falsa tranqüilidade.
Porém o coração contrito diz: “Volta à tua paz, oh alma minha!”. A justiça de Cristo lança fora o medo, dissipa todos os temores. Inclusive a própria maldade e corrupção do coração não podem verdadeiramente abalá-lo, porque tem depositado todos seus fardos sobre Cristo.
3. Não pode acontecer nenhum mal ao coração quebrantado. Para os não convertidos quão trágico é o leito de morte, ou de enfermidade, agitado e inquieto como uma besta selvagem aprisionada na rede! Em contraste, o coração quebrantado se posta satisfeito e sereno em Cristo.
Cristo lhe é suficiente; não ambiciona mais nada. Mesmo que tudo desapareça, seu amor, o amor a Cristo permanece. Está como um bebê de meses no regaço de sua mãe, confiante e seguro. Você conhece esse descanso tão seguro?
Fonte: Revista Os Puritanos.